terça-feira, 13 de julho de 2010

Democracia na Educação


Tem mais de 20 anos que escuto falar nesse bicho, às vezes comparo isso à lenda da enorme cobra que alguns juram de pés juntos, existe, sim, no riozinho que passa perto da casa aonde cresci. Dizem que é uma grande sucuri, trazida por uma família do Mato Grosso do Sul a uns 30 anos atrás.
Assim é o bicho da democracia, falam, discutem, dizem que ela existe, mas aonde está? A sociedade para mim é totalmente desconexa e apartada, alguns podem tudo, outros, podem nada. Alguns trabalham, outros fingem que trabalham, outros mendigam, outros recebem bolsas, e outros viajam. Ah, é bom lembrar que os que viajam são os nossos representantes, eleitos de forma democrática... democrática?! Bem, são os nossos representantes para que através deles tenhamos nossa democracia garantida!
Assim é a vida, ou melhor, a sobrevida, aonde alguns trabalham para pagar as bolsas e as viagens.
Também tem outra leva, a dos sonhadores, utópicos, pensadores. Eles defendem a democracia. Democracia na sala de aula, nos tribunais, nos presídios, nas favelas, nos subúrbios... não é irônico?! Uma pergunta: há quanto tempo esses teóricos não freqüentam uma sala de aula do ensino fundamental das escolas públicas? Ou melhor, eles já freqüentaram? Não sei, às vezes tenho a impressão de que as regras que devo SEGUIR, e de que as leis e conceitos que tenho de DECORAR, são elaboradas por pessoas com uma realidade bem diferente da minha, deve ser apenas impressão... Mas e aonde fica o princípio de que a política deve ser feita de acordo com a realidade de todos? Juntando todas as realidades, e nivelando para que fique bom não para a maioria, mas para todos!
Isso é realmente possível? Exigem gestão democrática, e por quem nossos gestores são geridos? Eles tem liberdade para atuarem, questionarem, dizerem sim e não? Ora, como exigir algo de uma escola, se ela tem normas pra seguir, tabelas pra preencher, prazos pra olhar, índices pra alcançar. Sim, eu escrevi índices. Um sistema aonde o aluno não passa de um número, e o que mais importa nele é a porcentagem que ele garantirá. Democracia? Colocar a comunidade para atuar junto das escolas? Espera aí... quem a está preparando para isso? Ah, já sei... a escola deve preparar, mas e quem está preparando a escola? Ah, já sei, a escola deve se auto - preparar. Porque tudo eu?! Porque tudo nós?! Isso me faz lembrar da gestão compartilhada. Isso me faz lembrar do Estado se eximindo de algo que cabe a ele. Porque eles deveriam se importar, se com um decreto, eles mandam, e a escola cumpre. Com que qualidade? Isso é algo que realmente não importa, uma vez que os índices sejam alcançados. De que forma? Bem, isso também é outra história. Além do que, os fins justificam os meios. Se eu concordo? Ah, isso também não importa!
É tão simples da forma que se expõe o fato: participação de todos! Não é lindo?! Mas que todos?! Aqueles professores que tiram atestados “de rotina”? Aqueles funcionários que mentem pra ir arrumar as unhas? Aqueles diretores que não se conformam em receber um “não concordo”, aqueles pais que fazem questão de dizer “ não sei mais o que fazer com meu filho”, que em época de férias ligam pra escola desesperados, pedindo porque as aulas estão demorando tanto pra começar? Ah! Quem nos está preparando para isso!?
É fácil dizer que a responsabilidade para algumas coisas é do Estado como eu disse acima, mas... em uma sociedade democrática o Estado não seriamos nós? Bem, não sei o que pensar, e que linha seguir. E porque eu sempre tenho de seguir uma linha? Do jeito que está, acredito que se abríssemos para que todos governassem e todos cumprissem, teríamos uma grande confusão, e, acredite, maior do que está hoje. Falamos, falamos, mas estamos preparados para uma gestão democrática? Estamos preparados pra tirar a bunda da cadeira e dizer o que nos agrada e aonde discorda-mos? Temos fundamentos, suporte, conhecimento e confiança pra fazer isso?
Antes de se falar tanto em gestão participativa democrática, deveríamos trabalhar nossas mentes, nossos valores e conceitos. Rever muitas coisas, e nos fazer perguntas do tipo: Eu quero uma gestão democrática? Porque se assim for, eu serei gestor também. Eu estou apto a buscar andar informado, trocar a novela das oito por artigos políticos e documentários sobre economia? Se estiver com sua testa franzida, caro leitor, a resposta é NÃO!
Li outro dia dois anúncios sobre uma cidade aqui do Paraná, em que se dizia que elas estavam livres do analfabetismo. E lá se encontravam: autoridades, imprensa, banners... ah! Quanta politicagem. Quem questionou a qualidade nisso tudo? Quem se perguntou aonde colocaram aquelas pessoas que não conseguem interpretar um texto, que não conseguem escrever um texto, que não sabem sequer o que seria um texto... Ah, sim... elas não são analfabetas...
Talvez você esteja imaginando a minha cara de exagero ao escrever tudo isso, mas te garanto que exagero maior é escrever sobre uma gestão democrática partindo do pressuposto de que todos querem isso, e de que todos estão preparados para isso, ou de que todos se empenharão para ficarem preparados.
Como dizia alguém, que não quero saber quem é: Eu estou no olho do furacão! Não escrevo essas linhas em um gabinete a prova de balas, ao som de Beethoven, com uma biblioteca linda, livre de traças e bugigangas. Eu escrevo estas linhas, no olho do furacão, eu escrevo estas linhas dentro de uma escola. Um lugar aonde você não sabe se vem preparado pra guerra ou pra mais uma simples batalha, aonde se recebe a diversidade cultural, a multiplicidade de valores, conceitos, costumes, e não sei mais o que. Fomos treinados pra isso?
A educação é uma ciência discutida muito teoricamente. Discursos bonitos, idéias, autores, linhas de pensamento que vão da tradicional até a histórico – crítica. Mas e aí? Cadê a prática?
Está certo, as tarefas precisam ser divididas, enquanto alguns pensam e escrevem, outros vão assistir a erupção, só que do lado de dentro...
Pra mim o ensino é quase uma instituição falida. Não em termos financeiros, não em investimento de material, isso, eu reconheço, que pelo menos aonde eu vivencio, está bom, ou deveria dizer que já foi muuitooo pior? Eu me refiro à qualidade de ensino, eu me refiro ao papel que realmente cabe a escola. Enquanto se ignorar esta verdade, de nada adianta gastar saliva falando sobre democracia.
Precisamos de estrutura, alguns colégios recebem material e estão caindo! Aonde guardar tanto livro? (E bons livros!), aonde guardar tanto material de apoio?
Precisamos de uma democracia que venha lá de cima, do patamar mais elevado da pirâmide. É injusto e metafórico acreditar em uma democracia que saia somente da escola.
Claro, eu sei... devemos fazer nossa parte. O problema é que nossa parte constitui-se de muitas partes, e isso está pesando demais. A escola, por ser responsável por muitas vias, acaba não fazendo nada direito. Desorganização? Talvez. Pressão? Talvez. Omissão? Talvez. Porque não estudamos sobre isso, então? Ah, e novamente, não sairemos dos discursos.
Depois de escrever isso tudo, que não é nada, concluo que estou um tanto quanto cansada.
Em um país aonde marginais não podem ser punidos, mas tem direito a voto.
Em um país aonde bolsas garantem este voto.
Em um país aonde a lei favorece a quem for mais esperto.
Em um país aonde o líder maior vem na mídia e diz não saber de nada sobre mensalões, e afins.
Em um país aonde a população não lembra o nome do vice – presidente.
Em um país aonde na hora de aprovar ou não um aluno o que mais pesa é os índices que temos de alcançar...
Vem alguém me falar de democracia?!
Democracia? Que bicho é esse?!
Andreia Detogni

"Se começássemos a dizer claramente que a democracia é uma piada, um engano, uma fachada, uma falácia e uma mentira, talvez pudéssemos nos entender melhor." (José Saramago)


"A democracia é uma forma de governo que prevê a livre discussão, mas que só é atingida se as pessoas pararem de falar." (Clement Atlee)

"A democracia surgiu quando, devido ao fato de que todos são iguais em certo sentido, acreditou-se que todos fossem absolutamente iguais entre si." (Aristóteles)

"A democracia fundada sobre a igualdade absoluta é a mais absoluta tirania." (Cesare Cantú)

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